quarta-feira, 1 de maio de 2013

A Carta.


Desde que ele pedira o endereço dela, numa noite meio que sem importância perdida no calendário, o carteiro passou a perceber que os olhos agora se esticavam para ver sua chegada. Abria a caixa, deixava o que tinha para deixar e logo via a cara de decepção da moça ao perceber que a tão esperada carta não chegava. Estranhava tanto tempo ter se passado e nada de receber as palavras dela.

Antes de dormir, ficava imaginando todos os perrengues que o envelope passaria para pousar em suas mãos. A viagem seria exaustiva, mas, ainda assim, conseguiria cumprir sua jornada e traria todo o sentimento que ali depositara. Sonhava com o que escreveria, como terminaria, o que colocaria junto da carta. Ele era criativo, lembrava, e logo voltava a fitar a caixa de correio.

Estranho era viver num mundo digital e esperar por algo físico, mas que seria facilmente traduzido num e-mail. Era mais simples, com certeza, mandar uma mensagem. Perdia o romantismo, pensou. Sorriu tentando se ver numa época diferente, se comunicando apenas por escritos e como seria a agonia da espera em ler mal traçadas linhas no papel. Nasceu no tempo errado, provavelmente.

Desde que escrevera ele avisara que ficaria em silêncio. O contato virtual que mantinham foi cortado para que, durante aqueles dias, pudessem experimentar a sensação da expectativa. Ela de receber, ele dela ler. Nem pareciam que estavam tão longe assim. Sempre tinham uma mensagem, um vídeo ao alcance. Se viam, mas a saudade aumentava. Não poder tocar e abraçar quem se ama é um tormento.

Num dia desses, ela saiu pulando depois de encontrar o carteiro. Não conseguiu nem conter a euforia e voltar para casa. Ali mesmo, do lado de fora de casa, abriu envelope e retirou as folhas. Devorou as linhas. Os contados dias de espera tinham valido à pena. Conseguiu pensar numa resposta e correu para escrever. O sorriso passou pela sala, subiu pelo quarto e se sentou à mesa. As mãos trabalhavam furiosamente.

Mandou uma mensagem agradecendo. Aquela expectativa tinha sido ótima. Adorara a experiência. Ficou relendo a carta por horas e horas. A saudade aumentara, mesmo sentindo que ele estava mais perto com a letra dele bem na sua frente. Cumprida a jornada, olhava pro papel e agora tinha certeza que a longa viagem valera. E pensou em como é gostoso receber alguma coisa de quem a gente ama.


- Gustavo Lacombe.

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