sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Lágrimas, Rímel, Cartas.




 Talvez ele não saiba que aquela dor que ele causou, calou os olhos dela violentamente por uns tempos. Isso não é crime, é carma: magoar alguém assim, dentro do melhor vestido, remover com lágrimas o rímel cuidadosamente passado, deixar tão descrente alguém que achava a vida mágica.


 Talvez ele nem desconfie que quando ele disse eu vou embora e ela tudo bem, logo que se deram as costas, ela respirou fundo uma, duas, três vezes, colocou quatro gotas de floral de Bach embaixo da língua e se afundou na tristeza (...) 

 Talvez ele nunca saiba que ela mudou os móveis de lugar (...) Dormiu no chão, quis mudar de religião. (...) Pensou em mudar de curso, de profissão, de cidade. Quis mudar de si, já que seu corpo era a casa de um só sentimento. Fez uma viagem, não quis conhecer ninguém, posou de antipática porque estava apática. Se escondeu da lua cheia, fez do seu quarto um campo de concentração e depois se mudou para sala. Trancou todas as portas pra não entrar qualquer ilusão. Por tanto tempo era ela e sua tristeza intransitiva. 

 O que ele também não sabe porque nem ela sabia, é que um dia ela acordaria assim, vazia daquele amor. A dor exaustiva de cabeceira havia cessado, deixada no fundo do poço. Parou de se alimentar daquela porção individual de desilusão e enterrou o passado num túmulo desconhecido, para que não houvesse a menor possibilidade de revisitá-lo. 

 Havia criado um mantra: No momento em que me dei inteira, ele me deu as costas. Isso não pode continuar supervalorizando uma saudade. Ser uma mulher curada de um amor, dependendo das circunstâncias, pode ser melhor que ser uma mulher amada... por ele. 

E o seu melhor vestido pedia uma nova chance e um rímel à prova dágua. 



- Marla de Queiroz.

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